A Polícia Militar diz que ‘não há qualquer possibilidade de suspensão de pagamento de salários e aquisição de insumos para dar continuidade aos serviços prestados pela Corporação’
Por Felipe Grinberg— Rio de Janeiro O GLOBO
A previsão de déficit de R$ 8,5 bilhões nas contas públicas fez com que o governo do Rio contingenciasse parte do orçamento da Polícia Militar. Um relatório da Diretoria Geral de Administração e Finanças da PM revela que foram bloqueados R$ 2,4 bilhões dos R$ 9 bilhões de recursos previstos para a corporação este ano. Apenas a folha de pagamento é de R$ 615 milhões por mês. Caso o valor continue contingenciado, os técnicos calculam que não haverá dinheiro para pagar os salários do último trimestre, incluindo a 2ª parcela do 13º. Já o investimento tem a previsão de queda de 77% em dois anos.
Em nota, a Polícia Militar diz que “não há qualquer possibilidade de suspensão de pagamento de salários e aquisição de insumos para dar continuidade aos serviços prestados pela Corporação”. A Secretaria de Planejamento (Seplag) diz que vê o orçamento da Polícia Militar com prioridade, mas que a “situação da PM não se distingue dos demais órgãos do Poder Executivo, em que essa contenção é necessária enquanto são feitas ações para enfrentar o déficit apontado na última lei orçamentária”. A pasta afirma ainda que “não significa que não haverá recursos para custear as despesas. Com a entrada de arrecadação, o recurso é liberado para as secretarias e órgãos”.
Dentro da folha de pagamento, mensalmente a PM desembolsa R$ 28 milhões para o Regime Adicional de Serviço (RAS), o “bico oficial” dos agentes. O custeio é visto como essencial para cobrir os buracos nas escalas de policiamento, já que hoje há o déficit de 17 mil policiais e somente metade dos 43 mil militares trabalham na atividade fim da corporação. A secretaria de Polícia Militar também desembolsa mensalmente R$ 9,5 milhões em 48 convênios no Programa Estadual de Integração na Segurança (PROEIS), que aumenta o número de agentes em algumas cidades e órgãos públicos.
“O recurso de R$ 6,2 bilhões é uma dotação suficiente para cobrir as despesas de Pessoal e Encargos Sociais referente ao período de janeiro até setembro. Para os meses de outubro até dezembro (incluindo a segunda parcela do 13° Salário) a Seplag irá precisar realizar o descontingenciamento do montante de R$ 2,4 bilhões”, diz o relatório técnicos da PM obtido pelo GLOBO.
Impacto na compra de combustíveis e ração
Outro grupo de despesas fixas da Polícia Militar em que há previsão de impacto com os cortes determinados pelo governo é o de contratos de serviços continuados. Entre eles estão os de aquisição de combustível, manutenção de viaturas, seguros de vida para os policiais e até da alimentação dos cães e cavalos da corporação. De acordo com o relatório financeiro, a PM calcula que com contratos vai gastar R$ 318 milhões em 2024, mas só foram disponibilizados pelo governo R$ 213 milhões. O governo reafirmou que o contingenciamento “não significa que não haverá recursos para custear as despesas”
Impacto nos contratos fixos
Com a previsão de falta de recursos para a compra de combustíveis, a Polícia Militar pediu para a Secretaria de Planejamento intermediar a solicitação ao Detran de um repasse de R$ 10 milhões. O dinheiro seria usado para abastecer as viaturas. A PM justifica que utiliza um “significativo efetivo” de agentes e veículos nas operações de apoio ao departamento de trânsito. Para 2024, os técnicos estimam que o custeio de gasolina chegue a R$ 104 milhões — 15,5% a mais que ano passado.
Projetos considerados exitosos pela Polícia Militar também correm risco de ser descontinuados. Entre eles, os aplicativos 190RJ, “Rede Escola” e “Rede Mulher”, que permitem o fácil acionamento de viaturas em caso de emergência. Até 19 de abril, o governo estadual não havia liberado nenhum centavo dos quase R$ 25 milhões para esses e outros programas de tecnologia. O valor é essencial para a “garantia operacional” e a “evolução” dos projetos, diz o relatório.
Outro alerta feitos pelos técnicos é o da contratação das câmeras embarcadas em viaturas, anunciada esse ano pelo governo estadual. Para pagar o contrato esse ano são necessários R$ 16 milhões, mas ainda falta liberar 30% dos recursos.
Queda no investimento
A compra de novos equipamentos para a polícia e outros investimentos também serão impactados com os cortes no orçamento da pasta. Apesar de uma lista de compras enumeradas pelos técnicos da corporação, como veículos e barcos blindados e coletes à prova de bala, há a dificuldade de concluir as aquisições. Os números apresentados no relatório mostram que o investimento caiu nos últimos dois anos em 77%.
Desde fevereiro a PM estuda a compra de mais seis veículos blindados de transporte de pessoal, os “caveirões” para o Comando de Operações Especiais da corporação. O custo total seria de R$ 21 milhões, mas o processo parou devido à falta de recursos:
“Foi elaborado o Estudo Técnico Preliminar (…) contudo, a Diretoria de Orçamento vem sinalizando quanto ao cenário orçamentário financeiro (…) Caso tenham parecer favorável para execução da despesa, sob a perspectiva das prioridades em face das restrições orçamentárias, será emitida a reserva”, diz trecho do processo de compra das viaturas.