Para falarmos do Patrono das Policias do Brasil em um contexto espacial devemos também mostrar o cenário da época. O caldo de cultura no Brasil foi se formando com as influências da Independência das 13 colônias que formariam os Estados Unidos (1776), Revolução Francesa com a Queda da Bastilha (1789) e Revolução Haitiana (início 1791) com a expulsão do o governo colonial francês. O reflexo se deu na colônia de Minas Gerais com a Inconfidência Mineira (1789-1792). O movimento pensado e planejado é considerado um dos precursores da independência do Brasil, pois ainda éramos colônia, fato que mudaria só em 1815 com o Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves quando a família real se estabeleceu em terras brasileiras. O movimento chamado de “inconfidência Mineira” foi pensado sob os valores iluministas e republicanos, vieram a se revoltar contra a opressão e determinações da metrópole refletidos nos altos impostos de uma gerencia fiscal abusiva, da corrupção e desmandos de autoridades portuguesas.
No Brasil a Inconfidência Mineira foi o palco de conspiração contra a coroa que tinha como objetivo a independência da capitania de Minas Gerais. Foi entre os personagens desta revolta que surge o nome de Joaquim José da Silva Xavier, “Tiradentes”, um personagem que se tornaria o patrono das policias brasileiras bem como patrono da Nação. Não foi o planejamento de uma revolta nativista como os movimentos de revolta e insatisfação que a antecederam, pois foi construído como republicano separatista da capitania de Minas Gerais do domínio colonial e político de Portugal.
O objetivo era um levante contra o sistema econômico e de governo adotado por Portugal. A capitania era a mais forte e influente devido a atividade mineradora de ouro que veio a trazer prosperidade, riqueza e grande desenvolvimento à região, sendo que em 1750, Vila Rica, cenário principal do evento da inconfidência já contava com 80 mil habitantes considerada uma das cidades mais populosas da América latina. Com os pesados impostos atribuídos à capitania, iniciou-se um processo de conspiração contra a metrópole através da elite socioeconômica. Neste meio houve uma exceção na liderança pois Joaquim José da Solva Xavier, o Tiradentes, republicano convicto e adepto dos ideais iluministas, não pertencia a elite econômica, mas era o militar que comandava e monitorava o “Caminho Novo”, estrada que ligava Minas Gerais ao Rio de Janeiro. Sem data precisa do início dos planos, segundo historiadores, calcula-se ter começado na década de 1780 onde com a insatisfação os revoltosos entendiam que a capitania sendo rica e autossuficiente economicamente poderia ser uma república independente. Com mais de 10 anos de planejamentos o estopim da revolta se deu contra a gestão do Visconde de Barbacena, governador da capitania (1788) por ser um governo eivado de abuso de poder e corrupção. O Visconde assumiu o governo com a orientação da Coroa de alcançar a meta de arrecadação de cem arrobas de ouro. Caso necessário fosse, deveria realizar a “derrama”, isto é, uma cobrança obrigatória exorbitante para alcançar a meta na coleta dos impostos. Foi na iminência da decretação desta ação de derrama que os inconfidentes resolveram colocar os planos em ação estipulando o início da revolta em Vila Rica na data da proclamação desta com o objetivo de se estender a toda capitania numa guerra de desgaste com a Coroa que se veria obrigada a negociar com os insurgentes. Tal intento não veio a acontecer pois foi denunciado por fazendeiros tendo Joaquim Silvério dos Reis o principal delator e o governador suspendendo a “derrama”. Caso a revolta se consolidasse teriam os seguintes objetivos: proclamar a república aos moldes dos Estados unidos; realizar eleições anuais; diversificar a economia e instalar manufaturas, formar uma milícia nacional e perdoar as dívidas dos inconfidentes. Após a denúncia e a suspensão do ato de “derrama” iniciou-se as prisões em um processo que durou três anos e uma sentença com 18 horas de leitura. As penas foram variadas desde decredação para África, a prisão perpétua e morte por enforcamento. Tiradentes e outros foram condenados ao enforcamento, mas antes da execução da pena foi recebida uma carta da rainha D. Maria de Portugal dando o perdão real a todos condenados à forca com exceção de Tiradentes. Entre todos Tiradentes era o de menor posição social e econômica, mas de grande importância no levante por ser líder militar e propagandista das ideias republicanas e iluministas. Foi o único a não ser perdoado e em 21 abril de 1792 foi enforcado (no Largo da Lampadosa-RJ), esquartejado tendo seus membros expostos na estrada que ligava Rio de Janeiro a Minas Gerais e sua cabeça exposta no centro de Vila Rica, hoje Ouro Preto, onde tem sua estátua. No terceiro dia de exposição em um poste em praça pública a cabeça foi roubada e nunca mais encontrada. Assim a Inconfidência Mineira e seus objetivos não se realizaram, mas foram base de outros movimentos como a Conjuração Baiana (1798) ambas com mesmos ideais.Por todos fatos Tiradentes ficou esquecido durante todo resto do período colonial e Imperial, principalmente pelo carácter republicado que a revolta defendia bem como os seus ideais. Soma-se a este incomodo o fato dos dois imperadores do Brasil serem descendentes da rainha D. Maria.
Com este histórico Tiradentes foi instituído como Patrono das Polícias Civis e Militares e Patrono da Nação Brasileira. No período colonial em que viveu, era conhecido por esta alcunha, pois era dentista por prática apesar de ser Alferes da Cavalaria dos Dragões Reais de Minas Gerais. Nasceu em na Vila de São João Del Rei em MG em 1746 e foi morto em 21 de abril de 1792 (46 anos). Os historiadores relatam que as últimas palavras antes do enforcamento foram: “Pois seja feita a vontade de Deus. Mil vidas eu tivesse mil vidas eu daria pela libertação da minha pátria”. Já no cadafalso teria dito ao executor: “seja rápido”.
Segundo o Decreto-lei 9.208 de 21 abril de 1946 foi instituído patrono da policiais civis e militares com os seguintes considerandos: “
“Considerando que entre os grandes da história pátria que se empenharam pela manutenção da ordem interna, a vulta a figura heróica de Alferes Joaquim José da Silva Xavier (Tiradentes) o qual, anteriormente aos acontecimentos que foram base de nossa Independência, prestara à segurança pública, quer na esfera militar quer na vida civil, patrióticos serviços assinalados em documentos do tempo e de indubitável autenticidade;
Considerando que a ação do indômito protomártir da Independência, como o soldado da Lei e da Ordem, deve constituir um paradigma para os que hoje exercem funções de defesa da segurança pública, como sejam as polícias civis e militares, às quais incumbe a manutenção da ordem e resguardo das instituições.” (grafia da época)
Em 1965 é declarado Patrono da Nação Brasileira através da Lei 4.897, com os seguintes considerandos:
“Art. 1º Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, é declarado patrono cívico da Nação Brasileira.
Art. 2º As Forças Armadas, os estabelecimentos de ensino, as repartições públicas e de economia mista, as sociedades anônimas em que o Poder Público for acionista e as empresas concessionárias de serviços públicos homenagearão, presentes os seus servidores na sede de seus serviços a excelsa memória desse patrono, nela inaugurando, com festividades, no próximo dia 21 de abril, efeméride comemorativa de seu holocausto, a efígie do glorioso republicano.
Parágrafo único. As festividades de que trata este artigo serão programadas anualmente.
Art. 3º Esta manifestação do povo e do Governo da República em homenagem ao Patrono da Nação Brasileira visa evidenciar que a sentença condenatória de Joaquim José da Silva Xavier não é labéu que lhe infame a memória, pois é reconhecida e proclamada oficialmente pelos seus concidadãos, como o mais alto título de glorificação do nosso maior compatriota de todos os tempos”.(grafia da época).
Enfim, tem-se em Tiradentes um símbolo de herói republicano por representar a liberdade de forma ampla. É elencado como o mártir da Inconfidência e várias representações surgem em filmes, livros e outras mídias. Na Brigada Militar temos vários relatos como o da Revista PINDORAMA (1927) com artigos sobre a vida e atuação de Tiradentes.
Jorge Luiz Agostini – Cel RR
Licenciado em História
FONTE HISTÓRICA