Grupo criado em 1895 preserva tradição, aproxima a corporação da comunidade e segue atuando em ações sociais no Vale do Sinos
Guilherme Sperafico Correio do Povo
“Um elo de integração e socialização com as comunidades, desde o seu surgimento”. Foi assim que, há exatos 130 anos, a Brigada Militar (BM) definiu o propósito de uma de suas unidades mais simbólicas: a Banda de Música do Comando Regional de Polícia Ostensiva – Vale do Rio dos Sinos (CRPO-VRS), popularmente conhecida como Banda do 3º BPM, sediada em Novo Hamburgo. Fundado em 15 de novembro de 1895 por decreto do então governador Júlio de Castilhos, o grupo nasceu em Porto Alegre junto ao 3º Batalhão de Infantaria – hoje 3º BPM – transferido para São Leopoldo em 1968 e, dois anos depois, para Novo Hamburgo, onde permanece até hoje.
A relação com o município também se explica por um gesto histórico. Segundo registros da BM, o terreno que abriga o batalhão foi doado pelo então prefeito Alceu Mosmann, desde que a banda também fosse transferida para a cidade, devido ao apreço que ele nutria pela música. Ao longo das décadas, o grupo se consolidou como um forte vínculo de aproximação entre a corporação e a população, participando de eventos sociais, escolares e comunitários. Entre as iniciativas mais reconhecidas está o projeto “Música e Saúde”, que leva apresentações a casas de longa permanência de idosos, além do apoio a ações do Proerd.
Em 2005, a banda passou a integrar oficialmente o CRPO-VRS, mantendo sua atividade. Em 2014, recebeu o reconhecimento como patrimônio histórico-cultural imaterial de Novo Hamburgo. Hoje, ao completar 130 anos, celebra não apenas sua história, mas a permanência de uma tradição que atravessa gerações. Atualmente, a banda tem o sargento e clarinetista Carlos Evandro Pinheiro do Prado como mestre.
O soldado André Ramon da Rosa Meireles, responsável pelo administrativo da banda, ressalta que representar a BM através da música vai além da técnica e da disciplina. É, segundo ele, uma forma de mostrar ao cidadão a dimensão humana do policial. “Significa uma enorme responsabilidade, pois o agir, falar e se portar do policial militar, sendo ele da banda ou não, refletirá na consciência e lembrança da pessoa, por uma vida inteira. Através da música rompemos barreiras que no contexto operacional muitas vezes não se obtém êxito”, afirma.
Ele destaca que o policial militar é um cidadão dedicado, que possui família, valores e sentimentos como qualquer pessoa, mas que muitas vezes abdica de si para cumprir a missão que lhe foi dada pelo Estado. “Esse conceito mais humano do policial é o que repassamos através da música, da cultura e das ações sociais que participamos nas comunidades. Fazemos parte da sociedade e somos, antes de policiais militares, humanos, pais, mães, filhos, filhas de alguém, sofremos as mesmas dificuldades e questões sociais”, ressalta.
Manter viva uma tradição centenária
Segundo Meireles, manter ativa uma banda com 130 anos de história exige dedicação diária, união do efetivo e apoio institucional. “São horas, dias, meses e anos dedicados a manter viva a chama cultural, tão difícil atualmente, mas possível pela união de todos, em prol de um objetivo comum” explica.
Ele ressalta que, sem o reconhecimento e sem o apoio do comando da corporação, dificilmente a banda chegaria ao aniversário atual. “O comando entende a importância desta atividade, mantendo a viabilidade e nos apoiando de todas as formas. Também alcancançamos o objetivo através do apoio da sociedade civil que reconhece nossa importância, como demostra o tombamento das bandas de música da Brigada Militar como patrimônio imaterial e cultural do Estado e, em particular essa banda, tombada pelo município de Novo Hamburgo”, pontua..
O ingresso de novos integrantes depende de aptidão musical e da aprovação em provas técnicas. “A seleção se dá através da identificação, na tropa, de militares que possuam conhecimento necessário, aptidão e que desejem fazer parte da banda. O policial precisa ter, no mínimo, comportamento bom e ser aprovado em prova escrita e prática”, detalha Meireles.
Há ainda um estágio de três meses, no qual o militar é acompanhado pelo integrante mais antigo. “O militar que estiver em estágio na Banda de Música poderá ser desligado a qualquer momento, se apresentar conduta incompatível com a de músico. Será considerado especialista músico apenas enquanto permanecer no exercício das funções”, explica.
“Antes de tudo, somos policiais”
Meireles destaca que, independente da especialização, todos os integrantes continuam sendo policiais. “Antes de tudo, somos policiais militares, com formação policial e com experiência de muitos anos na atividade, sendo regulados por legislação e normas interna. Nos trabalhos externos, sempre fardados ostensivamente para levar a imagem e presença da Brigada Militar em todos os deslocamentos e locais onde nos apresentamos”, afirma.
Além disso, os integrantes da banda realizam atividades operacionais sempre que o comando entende que é necessário, em circunstâncias extraordinárias, como ocorreu na pandemia e nas enchentes.
A rotina dos músicos inclui ensaios, estudos individuais, manutenção dos instrumentos, atividades administrativas e as apresentações externas. O repertório varia conforme o público e vai de músicas populares e infantis, a hinos e dobrados militares. Em alguns casos, a banda recebe desafios inesperados — como executar o hino de um país para recepcionar um embaixador, com a partitura chegando no dia anterior.
Entre tantas apresentações, as que mais ficaram marcadas na memória de Meireles aconteceram em uma casa voltada ao atendimento de crianças excepcionais, em Porto Alegre. “A gente sente a felicidade e alegria no rosto de cada criança, mesmo com todas as limitações que a vida lhe impôs, na simplicidade de uma música e no carinho dispensado a elas. Muitas vezes elas estão presas fisicamente a uma cama, mas tem seu dia transformado, colorido e alegrado por um simples gesto. É emocionante”, conclui.




