Após a megaoperação que deixou 121 mortos no Rio de Janeiro, integrantes do governo de Luiz Inácio Lula da Silva intensificaram a campanha em prol da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança Pública como uma das principais ações para combater o avanço das facções criminosas no país. Desde que foi formulada pela gestão do ministro da Justiça Ricardo Lewandowski, há mais de 18 meses, a PEC superou divergências dentro do próprio governo e hoje é alvo de críticas de parlamentares e governadores da oposição.
Enviada em abril ao Congresso Nacional, a proposta está nas mãos do relator, deputado Mendonça Filho (União-PE), que minimizou a cobrança por celeridade após a operação mais letal do Rio. Segundo o parlamentar, a medida “não tem capacidade de mudar o status quo” do estado e precisa ainda passar por uma “discussão aprofundada”.
O que prevê a PEC da Segurança?
A essência da PEC é ampliar o papel do governo federal para formular políticas da área e dar mais instrumentos para que o consiga coordená-las. Para isso, o texto altera artigos da Constituição que definem a competência de cada poder na segurança pública.
Além disso, também inclui o Sistema Único de Segurança Pública (Susp), que vigora por meio de uma lei ordinária desde 2018, na Constituição, a exemplo do que acontece com o Sistema Único de Saúde (SUS) e o Sistema Nacional de Educação.
Na visão de Lewandowski, isso vai dar mais força para que as forças policiais atuem de forma integrada com uma base de dados e procedimentos padronizados — o que não ocorre hoje.
Não interferência nos Estados
Diante de críticas de governadores e da oposição que a PEC usurpava poderes de estados, o Ministério da Justiça acrescentou um parágrafo para reforçar que a União não pretende invadir prerrogativas que hoje são dos governos estaduais. O texto diz que a PEC “não exclui” as “competências comuns e concorrentes dos demais entes federativos relativas à segurança pública e à defesa social, nem restringem a subordinação das polícias militares, civis e penais e dos corpos de bombeiros militares aos governadores dos Estados e do Distrito Federal”.
Um sistema criado para unir, mas que segue fragmentado
O Susp foi criado em 2018, durante o governo de Michel Temer, com a Lei nº 13.675/2018. A intenção era simples na teoria e ambiciosa na prática: unificar políticas e operações entre as forças federais, estaduais e municipais, com base em troca de dados, planejamento conjunto e coordenação centralizada pelo governo federal. No entanto, sete anos depois, o sistema ainda enfrenta entraves operacionais. Faltam padronização nos fluxos de informação, integração de bancos de dados e planejamento conjunto de ações entre polícias, Ministério Público, Judiciário e guardas municipais. Muitos Estados sequer estruturaram seus conselhos e planos estaduais de segurança, o que compromete a execução integrada das políticas. O jurista Eduardo Pazinato complementa que, na prática, o Susp vem sendo implementado de forma gradual, a partir de induções do governo federal. O que ocorre é uma adesão voluntária. A União lança programas e exige contrapartidas, como planos municipais de segurança, para que Estados e prefeituras recebam recursos, observa.
O desafio de tornar o Susp constitucional
O desafio de tornar o Susp constitucional Diante das dificuldades, o governo federal decidiu reforçar o Susp pela via constitucional. A PEC da Segurança Pública, enviada ao Congresso em abril, propõe incluir o sistema na Constituição Federal, garantindo continuidade das políticas, obrigatoriedade da cooperação federativa e segurança jurídica nas atribuições de cada ente. O objetivo é criar uma base sólida para que haja coordenação de esforços, compartilhamento de dados e continuidade das políticas, independentemente de mudanças de governo. Além de constitucionalizar o Susp, a proposta também atualiza as competências da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal e inclui no texto constitucional o Fundo Nacional de Segurança Pública e o Fundo Penitenciário Nacional. Para o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, a medida é essencial para enfrentar o crime organizado, que atua de forma interestadual e transnacional.
“O crime organizado hoje é um fenômeno nacional e até global. Precisamos de ações coordenadas, planejadas e integradas entre as forças federais, estaduais e municipais — afirmou o ministro, na terça-feira, após a operação no Rio.”




